A boa e velha comunicação sem pressa


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Como nasci no finzinho dos anos 1970, ainda peguei a comunicação por carta. Naquela época, havia menos fluxo de informação, mas eram duas, três, quatro páginas de notícias enviadas para a avó em outra cidade; lindos cartões postais para seus parentes quando você viajava; cartas para a melhor amiga durante aquela temporada que você passou fora; e até os bilhetes entre aulas demoravam mais pra chegar – você ficava com o bilhetinho ali, esperando a hora certa que não tinha ninguém olhando, pra responder. Às vezes tinha que esperar até a hora do recreio – mas tudo bem. Não havia pressa. E se havia pressa… você telefonava. E se a pessoa do outro lado não atendia, tudo bem: você ligava uma hora depois – e ninguém morria por isso.   

Agora venha brincar comigo.

Jogo 1: Se não tem o que dizer, não diga.

Deixe acumular mensagens não lidas no Facebook. Umas oito, no mínimo. Não abra. Não responda. E conte quantas dessas dessas pessoas vão telefonar pra dar o recado – ou, ao menos, te enviar um e-mail. É um pedido urgente? É importante? As saudades estão fora de controle? Se for, você receberá o recado por outros meios. Se não for… bem, esse jogo é divertido.

Jogo 2: Criança mimada

Vamos brincar agora de “criança mimada”. Abra a mensagem. Leia. E não responda. Se for caso de vida ou morte, o emissor já arrumou outra maneira de falar contigo, certo? Se não arrumou, deveria. Espere um dia. Dois. Três. E monitore quantas vezes o emissor da mensagem vai a) soltar uma indireta sobre pessoas que não respondem; b) cobrar uma resposta (“Oi, tá aí?”) ou c) ligar- não para dar o recado, mas pra perguntar por que você não respondeu a mensagem.

1, 2, 3 e já.

Vivemos uma época impaciente. As pessoas querem tudo pra ontem, querem respostas pra ontem, querem tudo pronto ontem. Como se não bastasse essa demanda vinda do outro, a gente vai lá e REFORÇA, e entra na pilha errada da comunicação em tempo real – que tem lá suas muitas vantagens, mas, por outro lado, é capaz de reforçar comportamentos esquisitos, transtornos paranóides, gente que espera disponibilidade 24/7 do outro – mesmo quando o assunto é besta. Porque, se não fosse besta, não seria comunicado pelo Facebook. Porque ainda tem isso, né? As pessoas esperam que você passe o dia no chat do Facebook.

Já me peguei me explicando por que não respondo de imediato. Meu celular é um android com 512mb de memória RAM e que, obviamente, trava a cada meia hora de tráfego de dados, sem espaço de cache pra trabalhar. Ou ele até está funcionando direito, mas comecei a responder – ou visualizei a mensagem – quando estava no ônibus ou na barca, e simplesmente desci (e você é doente se acha que o outro deve andar na rua digitando pra responder – o que inclui digitar “não posso falar agora porque estou andando na rua”. me poupe). Ou eu estava naqueles cinco minutinhos de dispersão durante o expediente, mas não estou mais, preciso trabalhar e honrar meu salário. Vou deixar o outro no vácuo mesmo, e não sei se vou continuar a conversa quando chegar em casa, porque tenho banho pra tomar, louça pra lavar, blog pra escrever, marido pra afofar…

Eu não devia nem estar explicando isso. Devia ser óbvio – mas não é. Não pra gente impaciente, que PRECISA de uma resposta agora. Não pra gente paranóica, que acha que você não gosta mais delas porque não respondeu uma mensagem pelo Facebook.

Então ficamos combinados assim: não reforçarás o comportamento paranóico do alheio. Não entrarás em pilha errada de imediatismo. Vamos retroceder um pouquinho, pra época em que ninguém cobrava presença online 24/7. Ao final de uma semana, me conte os resultados. Algo me diz que isso só pode fazer bem.

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