– Conhece alguém que escreva sobre sexo?
– Eu, ué.
– Tá a fim de ler ‘A Outra Vida de Catherine M.’?
– Manda! Livro nunca é demais.
* * *
“Pandora engoliu em seco. A rigidez do corpo dele contra o seu era quase insuportável de tão boa… Nunca se sentira tão feminina antes.
Não demorou e experimentou, com uma intensidade espantosa, todas as curvas de seu corpo, os seios, as nádegas, as coxas, sendo acariciadas por ele. A penugem do peito moreno roçava seus mamilos intumescidos, dando-lhe arrepios.
(…)
Desceu mais um pouco e passou a explorá-la nas partes íntimas. Pandora gemeu ao sentir que ele a penetrava com um dos dedos e a massageava por dentro. Recostou a cabeça no ombro largo, entregando-se. As sensações eram inacreditáveis”.
Catherine Millet escreve livros adultos, definitivamente adultos, mas essa putaria toda aí em cima foi, na verdade, extraída da pepita de ouro literária ‘O Príncipe do Deserto’, de autoria de Iris Johansen, publicada pela milenar coleção de romances Sabrina. Não espere ler sobre sexo em ‘A Outra Vida de Catherine M.’, cuja autora fala, no máximo, em fornicação. Para ler sobre movimentos sensuais e membros rígidos pressionados contra coxas roliças, favor se dirigir à banca de jornal mais próxima.
Por consideração a Catherine Millet, torço para que, apesar do tom autobiográfico de seu segundo romance em primeira pessoa, ‘A Outra Vida de Catherine M.’ seja tão ficção quanto os melhores livros em primeira pessoa de Paul Auster: a mulher é louca.
Veja bem: relacionamentos abertos existem aos montes, e até dão certo – porque são um acordo entre ambas as partes, que têm plena noção de que querem a mesma coisa. Catherine tem um relacionamento aberto e duradouro com Jacques, que dá certo desde que ela era uma garota aspirante a crítica de arte. Então, onde está o conflito – que faz com que você se interesse pelo livro a ponto de devorá-lo de uma só vez?
O conflito está dentro dela, que se rasga de ciúmes pelo homem, mesmo que seu discurso seja o de ‘vamos levar um relacionamento aberto e sem neuras’. Em ‘A outra vida’, ela confessa todas as neuras e as crises de ciúme doentias por levar esse relacionamento aberto com o sujeito. São 197 páginas de paranóia, ciúmes e conflito. Veja bem.
Peraí, Catherine: ou você aceita e fica cool com isso, ou procura um relacionamento que não te machuque tanto. Isso aí é masoquismo. A maneira como você relata as paranóias e as crises que chegam a produzir sensacões físicas é digna da recomendação de um psiquatra.
* * *
De fato, o ‘estilo sóbrio e elegante’ descrito na orelha percorre as 197 páginas de pura necessidade de publicar um segundo livro. Dessas 197 páginas, imagine que umas 64 tenham algo a dizer – as outras 133 são descritivas demais, narrativas demais, Catherine te enrola horas em vez de chegar direto ao ponto.
Confesso, ler as aventuras de Pandora e Phillip, aquele que chega sem camisa em cima de um cavalo selvagem, escritas por uma dona que já está em seu vigésimo livro ruim, pode não ser mais elegante – mas diverte, tem reviravoltas e um vocabulário que eu jamais cogitaria ler. Gosto de ser surpreendida por arte.
Mas e Cat-cat? Perdi meu tempo lendo?
Não. Lembra de ‘Inconscientes’, comédia genial que fazia troça dos estudos psicanalíticos sobre histeria e, ao mesmo tempo, era uma ode à referida linha de estudos? ‘A Outra vida de Catherine Millet’ nem chega a ser uma ode sobre alguma coisa, mas consigo encaixar direitinho o livro na seção de psicanálise. Imagino professores do segundo período de psicologia pedindo que os alunos leiam e analisem a personagem. Depois, que eles leiam e analisem a autora, que publicou 197 páginas escrevendo mais do que contando uma história.
Também me senti inspirada por Catherine, o que sempre é bom. Quando um autor te inspira a fazer sua própria arte, o a tua vontade de criação, é porque a obra não foi em vão: ela teve um motivo, um propósito.
Obrigada, Cath-M. Agora eu acredito que sei escrever.
Não acredito que sua intenção tenha sido essa. Mas isso é a subjetividade da arte: é o espectador interpreta como lhe convém, baseado em suas experiências pessoais e em todo o seu histórico de vida, seu processo de subjetivação.
É isso, galera. Agora não tenho mais desculpas. Meu primeiro livro vem aí.
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Literatura adulta por literatura adulta, leiam a coluna de Verônica Volúpia no Bolsa de Mulher! Membros rígidos e mamilos intumescidos em profusão! He, he.