Inah e Irene


Inah tem 94 anos bem vividos, 11 filhos (todos vivos e sempre em torno da mãe), vários netos, duas bisnetas já nascidas e mais dois a caminho. Inah teve uma vida humilde e sem luxos na pequena Bom Jardim (e criou 11, cara. Isso é admirável), o que não a impede de ser uma das senhoras mais elegantes que já vi na vida: minha avó tem porte de Jackie Kennedy Onassis, dedinho levantado quando pega a xícara, fala macia e calma com um leve sotaque português herdado da família. Comemoramos aniversário juntas, e a soma da idade dela sempre dá a soma da minha – o que sempre tratamos como novidade, embora seja uma questão de matemática que nos acompanha há 31 anos (ou seja, desde que nasci). Lúcida, ativa e dona de uma ótima memória, caiu outro dia, quebrou o fêmur e já voltou a andar. Só que aí caiu de novo, e já está na fisioterapia pra voltar a ir a missa com seus próprios pés.

Irene, baixinha invocada, 95 anos recém-completos, teve cinco filhas (uma delas já falecida), uma penca de netos, outra penca de bisnetos. A mais velha das irmãs e irmãos, saiu lá de Januária pra morar no Rio de Janeiro (e, depois, em Niterói), reza a lenda que aprontava, fingia desmaios para segurar o marido em casa, come doces, bolos, canjica (aniversário no dia de São João dá nisso, né?) e até uns 85 anos cozinhava um carré divino – e está aí, inteiraça, pequenininha, andando com sua bengala e agradecendo a deus todo dia por ter saúde, memória e netos e bisnetos carinhosos à sua volta. Mãe da minha avó Socorro, avó da minha mãe Angela, aguarda ansiosamente um tataraneto que, até mesmo pela diferença de idade entre eu e os outros bisnetos, é tarefa minha. Do jeito que as coisas andam pro meu lado, vai demorar. Mas boto a maior fé que vovó Irene estará viva pra ver.

Já perdi amigos aos trinta e poucos, já vi mortes de conhecidos ao 50 e aos 12, um avô morreu quando eu tinha 10 e o outro quando eu tinha uns 25, e pela ordem natural das coisas eu devia estar preparada para perder minhas avós a qualquer hora nos próximos anos. Afinal, isso é fato. É certo. VAI acontecer, e não é mau agouro da minha parte: faz parte do ciclo da vida, somos seres humanos e não costumamos passar dos 100 anos de idade. Morrer na tranquilidade depois de uma vida longa e de ter criado tanta gente boa que criou tanta gente boa que vai criar tanta gente boa devia ser motivo de comemoração e felicidade, não devia? Mas, então, por que raios a ideia de perder minhas velhinhas queridas e cheirosas a qualquer hora me deixa tão triste e agoniada?

Essa criação judaico-cristã ainda acaba comigo, viu?

Se a gente não aprende a lidar com a morte, que é a única coisa CERTA nessa vida, vai aprender o que, afinal…?

Deixe uma resposta