Inversão de valores
– Linda a sua bolsa! Comprou onde?
– Ah, menina, nem lembro! Foi em alguma lojinha barateira do Centro de Niterói.
– Pois é, outro dia comprei uma ótima, imitação de Adidas.. sabe aqueles três gominhos? A minha tem quatro!
– Hahaha genial!
– É, e não deve ter sido mais de dez reais.
– Muito foda! E é legal que só você tem, ninguém mais deve ter igual!
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Enquanto isso o jornal de domingo aponta que, do outro lado da cidade, garotos entram no tráfico porque assim podem ganhar dinheiro pra comprar ‘roupa de marca’.
Taí, isso é outra coisa da humanidade que me deixa triste – além, é claro, da sensação de impotência, porque por enquanto eu não posso fazer nada pra ajudar de verdade. Deixa estar.. em breve eu tou podendo.
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GAAAAAHHHHH
Grease, o Musical chega ao Rio de Janeiro no ano que vem. Falta quando mesmo?? Não importa. Vou me planejar desde AGORA pra não perder isso.
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E por falar em musicais..
Alguém lembra de Eduardo Dusek como o dentista de “A Pequena Loja dos Horrores”?
Quando eu era novinha, fiz questão de assistir à peça, porque já havia visto o filme umas vinte vezes.. coisa de criança que quer quebrar algum recorde na vida. Aliás, o filme passou essa madrugada (seis da manhã pra mim é madrugada) no TNT, e eu perdi – estava numa necessitada noite de sono.
Só pra deixar registrado que o primeiro trecho-de-filme-em-inglês-que-decorei-na-vida foi:

“On the twenty-first day of the month of September, in an early year of a decade not too long before our own,the human race suddenly encountered a deadly threat to its very existence. And this terrifying enemy surfaced – as such enemies often do – in the seemingly most innocent and unlikely of places.”

Anos depois, veio o clássico “Ezequiel 25:17”, trecho de “Pulp Fiction” que, embora pareça, não consta da Bíblia Sagrada. Pode procurar lá. Não há Ezequiel 25:17. Mas eu decorei a fala de Samuel Jackson, e transcreveria fácil aqui, procurando o texto original apenas para corrigir o mau inglês:

The path of the righteous man is beset on all sides by the inequities of the selfish and the tyranny of evil men. Blessed is he who, in the name of charity and good will, shepherds the weak through the valley of darkness, for he is truly his brothers’ keeper and the finder of lost children. And I will strike down upon thee with great vengeance and furious anger those, who attempt to poison and destroy my brothers.
And you will know my name is the Lord when I lay my vengeance upon you.

Escolha a vida, sua imbecil
Não muito tempo depois, eu ainda estava no pique de decorar trechos de filmes, surgiu o trecho mais decorável (e nem um pouco saudável) da história do cinema dos anos 90. Vamos lá, recitem comigo e com Ewan McGregor, na época ainda não muito conhecido, na pele de Mark Renton:

Choose Life. Choose a job. Choose a career. Choose a family. Choose a fucking big television. Choose washing machines, cars, compact disc players and electrical tin openers. Choose good health, low cholesterol, and dental insurance. Choose fixed interest mortgage repayments. Choose a starter home. Choose your friends. Choose leisurewear and matching luggage. Choose a three-piece suit on hire purchase in a range of fucking fabrics. Choose DIY and wondering who the fuck you are on a Sunday morning. Choose sitting on that couch watching mind-numbing, spirit-crushing game shows, stuffing fucking junk food into your mouth. Choose rotting away at the end of it all, pissing your last in a miserable home, nothing more than an embarrassment to the selfish, fucked up brats you spawned to replace yourselves. Choose your future. Choose life… But why would I want to do a thing like that? I chose not to choose life. I chose something else. And the reasons? There are no reasons. Who needs reasons when you’ve got heroin?

Eu tinha – ou tenho mas deixei na casa da minha mãe – uma camisa que ia só até o último “Choose Life”. Comprei a camisa antes de assistir a “Trainspotting”, me pareceu um motto saudável, uma crítica à vidinha mais-ou-merda classe média que a gente procura levar, por conforto ou comodismo ou os dois. Fãs de Blur se identificam com essas coisas, de algum modo – esse padrãozinho classe média britânica, mas que é igual em todo lugar do mundo – gente sem ambição. Lógico que depois de ver o filme, tive noção de que a crítica era não apenas a essa vidinha patética mas também à autodestruição como meio de fuga.
E a trilha sonora que juntava Iggy Pop e Lou Reed a coisas mais modernas e outras nem tanto (como New Order, ou Sleeper – bandinha indie pouco conhecida – fazendo cover de Blondie) e o visual que compactuava com o que eu gostava lá pelo começo de 96, toda essa embalagem me fez ver “Trainspotting” como meu hype pessoal. De alguma maneira, me identifiquei com tudo aquilo.
Deve ser porque, embora eu esteja longe, muito longe, se me afundar em drogas, tenho muito medo MESMO de me afundar em mediocridade. De não influenciar ninguém, de não fazer nada importante. E, se se afundar em drogas não é vida, não sair do lugar também não é (pelo menos não pra mim).
Talvez isso esteja para mudar nos próximos anos. UMA parte eu comecei hoje. A outra, começo daqui a alguns minutos.
Apenas fique atento.

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