De narrativas ancestrais ao desastre digital: como o storytelling perdeu sua alma


Eu escrevo.

Eu sei, meu site está pegando poeira, a newsletter está vergonhosamente parada, mas é porque ando escrevendo demais. Escrevo conteúdo para cerca de oito a dez clientes, coordeno a parte criativa com o designer e gerencio as publicações. Escrevo emails, propostas e o caralho a quatro. Escrevo nas minhas redes sociais porque os posts são curtos e rápidos. Escrevo.

E leio, vejo filmes, conto histórias. 

No meu trabalho, me preocupo em contar as histórias dos clientes em todos os seus pontos de contato. Fora do meu trabalho, conto histórias. Histórias de dinossauros, fadas, meninas poderosas, cupcakes e peidos para minha filha. Histórias talvez um pouco aumentadas no grupo de whatsapp das amigas para fazer as pessoas rirem um pouco (rir é um ato revolucionário, corpos tristes são facilmente dominados). Conto histórias reais para explicar meus vacilos. Conto histórias o tempo todo. 

Escrever sempre foi a forma que encontrei para organizar meus pensamentos, dar sentido às experiências e, muitas vezes, lidar com o caos interno. Mas a escrita nunca foi apenas sobre mim. É uma ponte, uma maneira de me conectar com o outro, de contar histórias que tocam, inspiram ou fazem refletir. 

Em um mundo onde o storytelling – ou melhor, a arte de contar histórias – se tornou um clichê corporativo e as máquinas substituíram a arte da escrita, me pergunto: como preservar o que há de mais humano nesse ato? Como manter a autenticidade em um cenário saturado de fórmulas e algoritmos?

Então agora vou contar para vocês uma história triste.

Era uma vez a arte de contar histórias

A arte de contar histórias é tão antiga quanto a própria humanidade. Desde os primórdios, os seres humanos sentiram a necessidade de dar sentido ao mundo ao seu redor, transmitindo experiências, conhecimentos e valores por meio de narrativas. Os gregos antigos, com seus mitos e lendas, moldaram a cultura ocidental, enquanto os romanos popularizaram a história oral através de seus aedos e rapsodos. 

Nas Américas, os povos pré-colombianos transmitiam suas tradições e crenças narrando sobre outros mitos e outras lendas. As praças, os mercados e os lares eram os palcos onde as histórias ganhavam vida, unindo as pessoas em torno de um bem comum: a experiência compartilhada.

Os povos indígenas brasileiros também possuem uma rica tradição oral, marcada pela profunda conexão com a natureza e pelos mitos que explicam a origem do mundo e a vida. As histórias indígenas são transmitidas através de cantos, danças, rituais e pinturas corporais. Elas servem para educar as novas gerações, fortalecer os laços comunitários e preservar a memória ancestral. 

E as histórias contadas no continente africano? Até hoje acreditamos e celebramos as histórias iorubás. Cada tribo e etnia possui um vasto repertório de contos e provérbios que transmitem seus valores, conhecimentos sobre a natureza e a história. 

A história oral, em particular, desempenha um papel fundamental na preservação da cultura e da memória coletiva. É com ela que as comunidades transmitem conhecimentos sobre a natureza, a história, a genealogia e os valores morais de geração em geração, moldando a identidade cultural de um povo.

Com a escrita, as narrativas, até então intangíveis, puderam ser registradas, preservadas por mais tempo e, assim, disseminadas para um público mais amplo. Posteriormente, as narrativas foram ganhando novas e mais elaboradas formas de expressão, como a poesia, a prosa e o drama.

Grande parte do que somos hoje é por causa da nossa capacidade de contar histórias. O que seríamos sem a Ilíada e a Odisseia, de Homero, ou sem a história de Jesus Cristo – que, real ou não, é o fundamento da nossa sociedade ocidental (e até do nosso calendário)? O que seria da cultura hindu sem o Mahabarata e o Ramayana? Como seria nossa vida sem contos de fadas ou sem fábulas? 

Tudo isso para chegar em 2025 e um corno escrever um prompt “Inclua um parágrafo de storytelling nesse post promocional para gerar conexão com meu cliente em potencial” em um LLM que insere oito clichês e lugares-comuns por frase e não sabe nem entregar um texto com o número de caracteres que você pediu. 

Narrativa x Storytelling

A diferença entre “narrativa” e “storytelling” pode ser mais uma questão de contexto cultural e apropriação terminológica do que de essência técnica.

Se considerarmos a perspectiva técnica ou teórica, narrativa e storytelling são essencialmente a mesma coisa. Ambos envolvem a construção de uma história com estrutura, enredo e propósito. Porém, o termo “storytelling” foi apropriado pelo marketing digital, principalmente no ambiente corporativo e publicitário, para nomear uma prática específica: usar histórias de forma estratégica, quase sempre com o objetivo de persuadir, vender ou engajar.

Ou seja, enquanto “narrativa” mantém sua abrangência e neutralidade conceitual, “storytelling”, no uso contemporâneo, ganhou um viés funcional e comercial, associado à aplicação prática desse conceito em campos como o marketing e o branding. Isso explica por que tantas pessoas tendem a tratá-los como diferentes, mesmo quando, em essência, não são.

A adoção do termo em inglês também confere um ar de gourmetização – a velha estratégia de revitalizar conceitos que já existiam. Em outras palavras, o marketing transformou “narrativa” em “storytelling” para vendê-la como uma ferramenta.

Para todos os efeitos, usarei ambos como sinônimos.

Se não gostou, pode parar de ler daqui mesmo. Sem ressentimentos. Vai ler um livro.

Foi o marketing digital que matou o storytelling com o candelabro na sala de jogos

Acho que foi lá por 2000 e pouco, com o advento do AdSense e da monetização dos blogs, que o trem do conteúdo começou a sair dos trilhos, como se buscasse o grande desastre de hoje.

Naquela época, com a possibilidade de ganhar por impressões e cliques – e quanto mais impressões, mais cliques –, sites e portais começaram a investir pesado na produção de conteúdo em quantidade. A meta era clara: publicar o maior número possível de artigos.

Tinha uns dois ou três colunistas de peso, um ou outro projeto inovador para experimentar novos formatos, mas a parte de notícias era um desfile de “notícias-que-não-são-notícias”. Notícias de subcelebridade, notinhas que não valeriam uma notinha, tudo assinado como “redação”. Nada revisado, ninguém assina, aquela coisa linda.

Ninguém me contou, eu vi.

Quantidade em detrimento da qualidade.

Primeiro veio o tráfego por e-mail, banners, redes de portais com links cruzados. Então, o Google começou a dominar as buscas e, na briga pelo ranqueamento na primeira página, as regras do jogo foram mudando. Entrou o tal do SEO – Search Engine Optimization – e, de repente, ele virou parte essencial do texto.

Se antes a quantidade era mais importante que a qualidade, agora todos os textos tinham que ser otimizados para SEO. Parágrafos curtos, intertítulos a cada respiro, e tome anúncio entre o intertítulo e o bloco de texto. A qualidade, que já vinha cambaleando pela pressão da quantidade, foi de vez para as cucuias. Todo texto na internet começou a parecer escrito com uma fórmula.

E claro, na briga pelo ranking, a quantidade de backlinks também contava. Vamos publicar mais. Acabou o dinheiro? Revisar pra quê? E se contratarmos esse redator que cobra barato porque não sabe usar vírgula direito? Ou que não tem a menor bagagem cultural pra entender do que se trata o post que ele mesmo está escrevendo?

Nas redes sociais, então, a coisa estava ainda pior. O algoritmo decretou que era preciso postar todo dia, mesmo que você não tivesse nada minimamente relevante a dizer. “Todo mundo sabe mexer no Instagram”, então bora desvalorizar o mercado e botar gente que entrega RÁPIDO um monte de texto sofrível.

O tipo de trabalho que um robô faria em 2025.

E agora, adivinha? Os robôs estão fazendo esse trabalho.

(Só que, spoiler: você não está descansando enquanto eles trabalham por você. Na verdade, está trabalhando mais, porque o nível de exigência subiu.)

Veja bem, este texto não é para criticar o uso de inteligência artificial na escrita. Não mesmo! Qualquer um que precisa escrever textos em lote com prazos, em escala industrial; qualquer redator lidando com bloqueio criativo ou que precisa escrever sobre assuntos fora da sua área de domínio sabe que bots ajudam a concatenar ideias, a fazer pesquisas, a entender melhor conceitos específicos fora da sua expertise. Robôs são excelentes tratadores de dados.

E os robôs poderiam fazer um bom trabalho, não fosse a quantidade de humanos picaretas por trás deles: jamais julgaria quem quer ganhar dinheiro fazendo um trabalho honesto, mas fazer cosplay de rico para orientar pessoas desesperadas por ganhar algum dinheiro a usar robô para escrever livro ou se posicionar como autoridade sobre assunto que não domina – o mesmo robô que não consegue te entregar um texto entre 600 e 800 caracteres porque não entende um comando simples, o mesmo robô que inventa referências bibliográficas, inventa trechos e é capaz de mudar de opinião oito vezes conforme você argumenta que ele está errado?

E sem orientar essas pessoas sobre as implicações éticas do uso dessas ferramentas?

Isso aí eu não posso dizer o que é porque não tenho advogados suficientes.

“Escolha um nicho e peça para o ChatGPT escrever para você”

Como hoje já tirei a madrugada para escrever mesmo, bora lá: sabe bordado? Sabe crochê? Sabe renda? Você, como o ChatGPT no plano gratuito, pode não saber muito bem a diferença entre um e outro, mas você sabe que são trabalhos manuais que envolvem fios e umas agulhas diferenciadas. 

Neste artigo – Artificial Intelligence in the Embroidery Community (https://lolliandgrace.com/blogs/blog/artificial-intelligence-in-the-embroidery-space) – e neste – I Am Not Real: Artificial Intelligence in the Needlework World (https://www.needlenthread.com/2024/10/i-am-not-real-artificial-intelligence-in-the-needlework-world.html) as autoras criticam o uso de imagens geradas por inteligência artificial na comunidade de bordado – um trabalho MANUAL, é, MANUAL. 

Tudo bem, vamos passar pano e falar que arte digital sempre foi arte, só muda o meio. Mas não. Não dá. Bordado é uma TÉCNICA, é um MEIO. Bordado digital não existe. Mas vá lá vamos fazer mais esforço para passar um mop giratório então, e aceitar as imagens de “bordado digital” como legítimas. Ainda assim, é inaceitável:

  1. se passar por artista de bordado fazendo uma merda dessas;
  2. vender moldes feitos por IA de algo que ninguém nunca fez manualmente (ou seja: deve estar cheio de erros);
  3. ah, que ótimo, as pessoas agora querem que bordadeiras reproduzam fielmente bordados que não existem; o padrão estético do bordado agora é algo que não existe.

Calma que piora.

Este artigo aqui – AI-Generated Book Grifters Threaten The Future of Lace-Making (https://www.404media.co/bobbin-tatting-lace-ai-generated-books/) – aponta que o impacto do conteúdo gerado por IA é ainda maior (e pior) do que parece: a comunidade de rendaria e crochê já tem e-books e cursos inteiramente gerados por inteligência artificial – que obviamente são totalmente errados, ensinam coisas erradas, têm imagens impossíveis de serem reproduzidas, fontes e referências que não existem. 

Calma, dá para piorar ainda mais. 

 Livros e guias totalmente produzidos por inteligência artificial ensinando a identificar cogumelos (https://www.404media.co/ai-generated-mushroom-foraging-books-amazon). Um bordado malfeito não mata ninguém, né? Mas imagina comer um cogumelo errado?

A culpa é da Jornada do Herói. Ou melhor: dos mentores.

A viagem do herói ao Paraíso

A Jornada do Herói, definida por Joseph Campbell no livro O Herói de Mil Faces, é aquele padrão clássico de narrativa que aparece em tudo quanto é história que a gente conhece do universo pop: o herói sai em busca de aventura, cruza com um mentor, encara uns perrengues gigantes e, depois de passar por várias provações, volta para casa uma pessoa transformada (e com o elixir, ou O Um Anel, ou dominando a Força, ou… insira aqui sua variação favorita).

A estrutura é dividida em três atos principais: a partida, que é quando o herói recebe o chamado para a aventura; a iniciação, onde ele encara os desafios, aprende lições importantes e vai ganhando sabedoria; e o retorno, que é quando ele volta para seu mundo original com um “elixir” ou um novo entendimento que não só muda a vida dele, mas também pode ajudar a comunidade.

Segundo Campbell, essa fórmula não é à toa: é um monomito, ou seja, um modelo universal que reflete experiências humanas básicas, repetidas em mitos e histórias do mundo inteiro desde sempre.

Errado não está.

Mas está longe de ser a única estrutura narrativa. Ela ficou conhecida no meio do marketing digital porque encaixa perfeitamente com essa comunidade que VENDE cursos e mentorias e, assim, encontra na jornada do herói o argumento de vendas perfeito.

Fazendo um doomscrolling no Instagram, é fácil encontrar exemplos desse show de horrores: fórmulas genéricas, dicas rápidas e promessas vazias sobre como criar narrativas que vendem, baseadas na metodologia proposta por Donald Miller em seu livro StoryBrand: uma fórmula narrativa baseada na jornada do herói, adaptada ao marketing, em uma abordagem que coloca o cliente no centro da narrativa. Nada contra — a proposta dele funciona bem. Li o livro, inclusive.

(se quiser ler também, o link de afiliado da Amazon está aqui)

O problema não é o método de Miller, que é eficaz no contexto do marketing e das vendas, mas seus mensageiros. Muitos dos “mentores” que difundem essas fórmulas nunca estudaram comunicação, cinema, roteiro ou criação literária, têm Miller como única referência, e vendem “storytelling” como… como esse negócio aí que eu não consigo chamar de storytelling, que é dizer para um bot “crie um storytelling no primeiro parágrafo para gerar conexão imediata com meu leitor”, o bot vai inventar uma historinha ruim, e você, que conhece a saga da Família Buendía, os sete Perpétuos, que ao menos sabe quem é Riobaldo, vai revirar os olhos de desgosto. 

É como se todas as marcas agora tivessem a mesma história: um ‘porquê’ inspirador, um ‘momento de crise’ e uma ‘superação’. Troque os logos e você nem perceberá a diferença.

Reduzir storytelling a uma técnica de vendas baseada na jornada do herói é culturalmente pobre, especialmente considerando a complexidade do conceito de narrativa. Mas o que esperar de gente que faz cosplay de rico pra vender curso, não é mesmo?

O que importa é guiar leigos na incrível e fácil arte de ganhar dinheiro no “digital”, esse lugar paradisíaco, essa Pandora, esse Éden onde é possível faturar sete dígitos fazendo pessoas comerem cogumelo envenenado porque você é um iludido que acha que pode ganhar dinheiro fácil fingindo que é especialista em algo, enquanto delegar TUDO a um robô incapaz de checar uma fonte.

E, para esse público sem discernimento, qualquer historinha mequetrefe gera conexão e desejo de compra. 

A crise da narração e a banalização do storytelling

Byung-Chul Han, em seu livro A crise da narração (link de afiliado da Amazon) aborda como o storytelling se transformou em “storyselling”. O conceito de narrativa, antes ligado à profundidade e à transmissão de experiências, foi reduzido a uma técnica de vendas. Han analisa isso com profundidade teórica, enquanto minha perspectiva, confesso, é mais empírica.

(fui mais fundo do que deveria no doomscrolling de rede social. Preciso de um detox)

Roland Barthes, por sua vez, vai até a Poética de Aristóteles para definir narrativa como algo que não depende necessariamente de personagens. Segundo ele, “a noção de personagens é secundária, meramente submissa à noção de ação”. Para Aristóteles, citado por Barthes, “pode haver fábula sem «caracteres», mas não existem caracteres sem fábula”. Os personagens podem ser apenas agentes da ação, sem profundidade individual. 

(Livro Análise Estrutural da Narrativa – link de afiliado da Amazon)

Nem todas as narrativas seguem a fórmula da jornada do herói. Existem narrativas de busca de si, narrativas com múltiplos sujeitos ou objetivos sucessivos. Quem já leu Análise Estrutural da Narrativa sabe que as possibilidades narrativas são vastas e não se restringem a uma única estrutura. Quem já leu livros sabe disso.

Entretanto, no universo do marketing digital, a abordagem dominante reduz narrativa à Jornada do Herói. Parece até que até os cursos de storytelling que vocês estão dando foram feitos com bot também, porque é sempre a mesma referência única. Parece até que só a Jornada do Herói cria conexão com a audiência.

Sabe quem cria conexão com a audiência? 

A própria audiência. O receptor da mensagem.

O papel do receptor na narrativa

Gérard Genette, em seu texto Discurso da Narrativa, define: “Narrativa designa o enunciado narrativo, o discurso oral ou escrito que assume a relação de um acontecimento ou de uma série de acontecimentos […] Num segundo sentido, menos difundido, […] narrativa designa a sucessão de acontecimentos, reais ou fictícios, que constituem o objeto desse discurso, e as suas diversas relações de encadeamento, de oposição, de repetição etc”.

Nesse contexto, é fundamental lembrar que a narrativa só existe plenamente com a participação do receptor. A comunicação básica ensina: mensageiro > mensagem > receptor.

Portanto, a conexão com o público depende mais da predisposição do receptor em se engajar do que da narrativa em si. 

A jornada do herói pode funcionar em contextos específicos, mas, como já vimos com Barthes, não é universal. 

Por outro lado, textos genéricos baseados em fórmulas prontas também podem criar conexão, porque exploram o desejo humano por histórias simples e fáceis de entender. No entanto, isso não é necessariamente narrativa — é apenas técnica. É a narrativa sendo reduzida a um mero ingrediente para uma receita de sucesso. 

E nesse buraco negro tem “4 storytelling prompts to make your stories sell”, tem gente que nunca leu Análise Estrutural da Narrativa, nunca leu um Robert McKee, ensinando gente que quer VIVER DE DIGITAL (sic) a fazer storytelling com ajuda de um bot que adjetiva tudo como “crucial”.

1. A narrativa na marca pessoal ou corporativa: Aqui, a história é mais elaborada, com elementos da jornada do herói em que o herói é o autor da história, para criar empatia. Ela é repetida de tempos em tempos para reforçar que o herói é como você – uma pessoa branca de classe média que trabalhou anos no mundo corporativo, mas diz que começou do zero – para te convencer de que, com a mentoria certa, você também pode ser herói. 

Comovente.

2. A micronarrativa em cada post: Geralmente, essa narrativa segue uma estrutura básica — problema, superação, solução — e é produzida de forma padronizada, muitas vezes por ferramentas como o ChatGPT. Mais uma vez, nada contra histórias curtas. É possível criar micro-histórias absolutamente envolventes. 

Mas veja bem, a pessoa que se endivida para comprar um curso porque acredita que uma estratégia de tráfego pago é feita sem verba alguma (ué, mas não é pago?) vai se envolver com qualquer coisa. QUALQUER coisa.

Só para terminar…

No início deste texto, falei sobre como a escrita me ajuda a organizar meus pensamentos e conectar ideias. Essa mesma habilidade, que é tão profundamente humana, é o que nos distingue em um mundo onde narrativas estão sendo embaladas e replicadas por máquinas. 

Não é a estrutura perfeita ou a resposta instantânea que nos faz lembrar de uma história, mas sim a vulnerabilidade, o detalhe único, a verdade que pulsa nas entrelinhas. Se há algo que a escrita autêntica ainda pode nos ensinar – e que a inteligência artificial ainda não domina – é a arte de fazer do ato de contar histórias um espelho da alma humana. 

E talvez seja exatamente isso que precisemos lembrar agora: mais do que nunca, precisamos de histórias que nos lembrem de sermos humanos.

A falta de narrativas autênticas resulta em uma sociedade desorientada, onde as pessoas se sentem desconectadas umas das outras. Byung-Chul Han, em A crise da narração,  argumenta que essa desintegração do sentido comunitário é um reflexo da crise mais ampla do humano na era digital.

Para Han, o resgate da narração é fundamental para restaurar a experiência coletiva e combater a superficialidade informativa. Ele sugere que a recuperação das narrativas significativas pode ser uma forma de reestabelecer conexões humanas profundas.

Complemento aqui falando que, embora fórmulas e ferramentas digitais sejam muito úteis no contexto capitalista em que a gente precisa produzir em ESCALA, elas não substituem o conhecimento teórico e a sensibilidade criativa. 

Novamente: não estou criticando o uso da inteligência artificial na escrita. A IA pode ser útil em vários processos. Mas estou cada dia mais pistola essa estética pobre de storytelling para marketing que as pessoas delegam a um robô justamente porque elas não querem conexão coisa alguma – é apenas técnica de vendas.

Existem inúmeros exemplos de campanhas de marketing que resgatam a narrativa como um recurso genuíno de conexão, e não como um mero atalho para vendas.

(quem nunca se pegou chorando vendo anúncio de carro, sanduíche, outro dia mesmo me emocionei com um comercial de ar-condicionado)

Não dá para esperar nada de quem ensina que está tudo bem alguém se posicionar como expert ou como autor de livros apenas com a expertise de um bot de Large Language Model que erra MUITO, que inventa referências bibliográficas, e cujo conhecimento se baseia apenas no lugar-comum.  

O storytelling corporativo não precisa de “personagens heróicos” – precisa apenas de uma boa articulação entre eventos e forma narrativa – com ajuda da boa e velha criatividade humana.

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