À Deriva


E por falar em longa para o mercado internacional, ‘À Deriva’, de Heitor Dhalia, é lindo. Seu filme anterior, ‘O Cheiro do Ralo’, era esquisitão, baseado numa história de Lourenço Mutarelli, e não me surpreende que F. tenha dito outro dia que Dhalia não consegue mais verba para filmar. ‘O Cheiro do Ralo’ não é o filme mais comercial do mundo. A bem da verdade ‘À Deriva’ também não é.

Mas ‘À Deriva’ é uma história universal, que poderia se passar no Guarujá, em Cabo Frio, Búzios ou na Côte D’Azur. Durante as férias na casa de praia, a jovem Filipa (a excelente Laura Neiva) vê o casamento de seus pais ruir, ao mesmo tempo em que tem que lidar com todos aqueles dramas adolescentes: a descoberta de sua sexualidade e a descoberta de que o mundo adulto é feito de aparências e hipocrisias. E, apesar da praia, dos adolescentes e de Cauã Raymond, ‘À Deriva’ está longe de ser um filme leve e ensolarado: a separação de Mathias (Vincent Cassel) e Clarice (Deborah Bloch, perfeita no papel de mulher de francês) é tensa e dramática, ajudada pela trilha espetacular. O espectador é jogado no auge de uma história de falta de comunicação com pelo menos uns quinze anos de ruído entre as partes, e acompanha de perto suas consequências. Como quem não sabe se comunicar não sabe mesmo, os pais de Filipa estão ocupados demais de seus próprios problemas para perceberem que sua filha cresceu. E Filipa, ocupada demais com sua adolescência para entender o que realmente está em jogo.

Não se deixem enganar pelo trailer, que mostra apenas um draminha passado na praia. A tensão do filme só não é mais agoniante porque as belíssimas paisagens aliviam a claustrofobia interna em que se meteram os personagens. É tudo tão lindo e arejado que até contrabalança a sensação de sufoco que a história do filme te leva a sentir.

Aliás, palmas para a produção de arte: sem que se mencione o ano em que a trama se passa, cada mínimo detalhe remete ao começo dos anos 80 – sem exageros e afetações, como realmente era na época, e com sua verossimilhança reforçada pela película 16mm em que o filme foi rodado e pelo filtro meio amarelado. Ok, a produção de elenco pecou um pouco por botar umas duas barriguinhas saradas no filme – mas não compromete. Garanto.

Garanto e recomendo. Veja enquanto ainda está em cartaz. E cante ‘Be My Baby’ para a pessoa ao seu lado, ainda que você não o (a) conheça. Fará bem.

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Continuem participando da promo do post aí embaixo: o livro ‘Uma paixão por cultura’ é ótimo e eu realmente quero saber qual foi o filme cabeça que você tem vergonha de admitir que não viu (ou não gostou). Me sinto muito sozinha não gostando (ou não entendendo) ‘2001’. Sua vez de contar.

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